Acompanho em Parauapebas movimentos que buscam retornar o debate sobre a fragmentação territorial paraense. Agora sobre nova nomenclatura, novos “discursos”, mas com as figuras dirigentes de sempre. O que pode tornar o processo mais “inseguro” do ponto de vista do convencimento ou até mesmo da aceitação popular. Não sou contra a divisão do Pará com a criação de novos entes federativos, mas me posiciono de forma crítica à forma de como esse processo foi e ainda poderá ser feito.
Não há dúvida que as regiões sul e sudeste do Pará recebem pouca ou quase nenhuma atenção dos grupos políticos que passaram ou estão no Palácio dos Despachos. O descaso é histórico e não deverá mudar no atual cenário político, nem a médio prazo. O orçamento anual do governo do Estado é o maior exemplo de como as regiões citadas são tratadas. O debate precisa ser aperfeiçoado. Não cabe mais (nem ao senso comum) discursos como: “Pará é muito grande, não há como governar”. Se a dimensão territorial fosse problema, por exemplo, os estados de Sergipe e Alagoas teriam os melhores índices de Desenvolvimento Humano do país, e estão bem longe disso. Esse é só um exemplo de erros que ocorreram e que – pelo visto – continuam a ocorrer no processo dialético em torno da fragmentação territorial paraense.
Em setembro de 2011, promovi juntamente com algumas pessoas, debate sobre a divisão do território paraense, no auditório de uma faculdade particular em que ministrava aulas, em Belém. Na ocasião, estavam debatendo os deputados estaduais Celso Sabino (PSDB, na época no PR) e João Salame (PP, na época PPS), hoje ex-prefeito de Marabá. Atuei como mediador e fiz algumas considerações sobre o processo, buscando não interferir no posicionamento de ambos.
O palco agendado (capital do Estado, majoritariamente contra a proposta fragmentadora) tornava o debate desproporcional, claramente favorável ao grupo do “Não”, aqueles que defendiam a manutenção territorial do Pará. Ficava claro o reconhecimento por parte dos belenenses que as regiões que estavam requerendo a independência político-administrativa não tinham a devida atenção por parte do Estado, altamente concentrado na Região Metropolitana de Belém. Por outro lado, a desconfiança na divisão restrita aos interesses políticos locais, derrubavam qualquer pretensão de apoio da maioria, que se materializou na derrota acachapante nas urnas. Em dezembro de 2011, o plebiscito da divisão territorial do Pará estava definido. O NÃO venceu com certa folga nos dois casos: a criação dos Estados de Carajás (sul e sudeste paraense) e Tapajós (oeste do Pará) não foram aprovados. O Pará manteve as suas dimensões territoriais continentais, com pouco mais de 1,2 milhão de km².
Já abordei o tema diversas vezes, pelo menos, uma vez por ano, desde o plebiscito. Provoquei o debate sobre a questão diversas vezes e nada mudou. Nem o governo do Pará avançou no combate às desigualdades regionais e nem ações para a retomada do debate de fragmentação territorial retornaram. Pelo contrário, o Palácio dos Despachos sob a dinastia tucana aprofunda as assimetrias regionais.
Pela legislação da época, caso Carajás fosse criado, por dez anos, a União teria a obrigação de manter o custeio do novo ente federativo. Hoje, a situação de Carajás estaria um caos em relação as finanças públicas, haja vista, a crise que o país atravessa, cortes por parte do governo federal, e diversos Estados “quebrados”, quase sem recursos para manter o custeio de suas máquinas administrativas.
É fato irrefutável que, o governo do Estado, historicamente, centraliza suas ações em Belém e seus arredores. Diversas regiões do continental território paraense estão largadas à própria sorte, sem a presença de ações de políticas públicas estaduais. E foi neste mesmo sentido que a proposta avançou no campo jurídico e foi rejeitado nas urnas. Belém e sua área metropolitana sendo – de longe – o maior colégio eleitoral do Pará, garantiu a integridade territorial, derrubando a pretensão de milhares de pessoas em terem um Estado mais perto, mais atuante, pelo menos, na teoria. Outro fator flagrante é a falta de representação política da região sudeste nos parlamentos estadual e federal, o que faz “virar água” qualquer pretensão ou disputa política em prol da região. Haja vista, que pretensões de natureza emancipatória precisa fundamentalmente de presença e atuação política (no caso do Pará, em Belém e em Brasília).
Na região de Carajás, o então deputado federal Giovanni Queiroz (PDT) foi o principal articulador para o surgimento de um novo Estado. Em 2014, depois de três anos da derrota nas urnas, o parlamentar articulou na Câmara dos Deputados para que o projeto voltasse à Casa e fosse restruturado, agora com diversas alterações. A proposta era facilitar os trâmites processuais e o seu formato de aprovação, agora não mais em todo território e sim na área que será emancipada.
Depois desta investida, tudo parou. Não se fala mais sobre a questão. E no atual cenário econômico do país, qualquer proposta que gere custo deverá ser barrada. Não há qualquer possibilidade de avanço sobre a questão do Estado de Carajás, pelo menos a curto prazo. A região que gera a maior riqueza ao PIB paraense é também um grande vazio institucional, o que gera insegurança de todas as ordens.
Em 2014, por exemplo, a título comparativo, a RMB, teve R$ 5,9 bilhões em recursos do tesouro estadual e passou a ter em 2015 R$ 11,7 bilhões. Aumento de 96% em 12 meses. E a projeção de crescimento continuou para o ano seguinte, 2016, passando dos 14 bilhões de reais. Pouco mais de 70% de todo o orçamento estadual foi investido na capital Belém e seus outros cinco municípios que formam a RMB. Já para a região de Carajás (centro de produção econômica do Pará) teve o orçamento reduzido em mais da metade em comparação ao mesmo período. Carajás tinha orçamento na ordem de R$ 1 bilhão em 2015 e passou a ter apenas R$ 438,2 milhões para o ano passado. A região que mantém porcentagem considerável na balança comercial paraense, teve corte de mais de 50% nos investimentos. Ou seja, menos presença do Estado, mais desigualdade regional.
Os cortes para as regiões mais afastadas de Belém continuaram em 2016. A projeção orçamentária quase toda executada para o ano corrente foi na ordem de R$ 24,593 bilhões, para atender as principais metas do governo. Não será espanto mais reduções para as regiões sul, sudeste e oeste do Pará para o orçamento de 2018.
Enquanto se aprofundam as desigualdades regionais paraenses, Carajás continuará a manter grande parte do PIB estadual, mesmo sem fazer parte – pelo menos – nos planos oficiais das ações do Palácio dos Despachos. Belém a cada dia vai ficando mais longe do resto do Pará e as regiões sul e sudeste mais longe do Palácio dos Despachos. O Estado de Carajás se resumirá a uma pretensão, um desejo? Ou mediado pelo senso comum a um oportunismo de alguns? Sem força política regional, o processo continuará no plano das ideias, ou quando sair dela, ou seja, tornando-se prática, como no caso do plebiscito de 2011, poderá ser derrotada novamente por erros grotescos de estratégia?