Cercos e o recuo estratégico. O mundo real novamente se impôs

Depois de avançar muito sobre os limites do cargo que ocupa, ameaçar a manutenção do regime democrático, atentar contra outros Poderes, instigar o descumprimento de medidas judiciais, o presidente Jair Bolsonaro recuou de forma incisiva, que inclui desmentir o que disse e emitir uma carta (comunicado) à nação. Isso tudo em pouco mais de 48 horas do dia 07 de setembro, data esperada por seus apoiadores para a ruptura institucional.

Bolsonaro sempre esticou e soltou a corda, um jogo de avanços e recuos. É assim desde quando assumiu. Da mesma forma que avançou muito no último feriado, agora, neste caso ontem (09), recuou de forma considerável. Por quê?

Primeiramente, o golpe pensado por Jair fracassou. Esperava-se um levante das Polícias Militares, o que não ocorreu; as Forças Armadas, em especial, o Exército, não embarcou no apoio ao processo de ruptura institucional; a adesão dos apoiadores em Brasília ficou muito abaixo do esperado, mesmo que as manifestações tivessem sido organizadas há dois meses. Pelo Brasil os bolsonaristas não impressionaram em volume de ocupação nas ruas. Portanto, não se reuniu minimamente as condições para golpear a democracia de forma definitiva.

Bolsonaro perdeu. O presidente saiu menor politicamente deste processo. Suas narrativas e ações não acrescentaram nenhum novo apoiador. Pelo contrário, perdeu. Com o recuo de ontem (09), perdeu mais ainda. Jair mantém 20% do eleitorado fiel as suas ideias, e tal quantitativo é o que lhe restou desde 2019. Todavia, esse público, considerado mais truculento espera de seu “mito” uma atitude de confronto, ações enérgicas, mesmo que muitas apenas fiquem na palavra. Mas o combustível de sua militância é o embate que o presidente alimenta, por isso, o recuo provocará um grande estrago político ao mandatário nacional.

O dia sete de setembro era importante, mas a data seguinte era muito mais, como de fato foi. As respostas ao que foi fomentado pelo presidente no feriado, norteariam o processo seguinte. Luiz Fux, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) reagiu fortemente as falas de Bolsonaro. Enquadrou o presidente. Em tom pacificador, seguiram o Procurador-Geral da República, Augusto Aras e o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL) que resolveram por “panos quentes” na questão. A réplica de Fux chancelada por seus pares, foi dura e entendida pelo Palácio do Planalto como uma ação clara que a Suprema Corte não iria se intimidar, portanto, manteria a sua posição, e o ministro Alexandre de Moraes continuaria com a sua atitude enérgica. Por fim, dentro do quadrante do Judiciário, o ministro Luiz Roberto Barroso, atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) teceu duras críticas aos que atuam contra a democracia, colocando em xeque o sistema eleitoral. Sem citar nominalmente Jair Bolsonaro, mas o recado foi direto ao presidente.

Mas, por que Bolsonaro recuou? Bolsonarismo por natureza é distópico. Ou seja, vive em um mundo paralelo. Todavia, como já dito aqui em outros artigos, sempre o mundo real se impõe a esse reino de fantasia. O pós sete de setembro o governo percebeu que foi feito cercos político e econômicos em seu entorno. As pautas do Senado Federal foram fechadas pelo presidente Rodrigo Pacheco (DEM-MG). Na Câmara, apesar de Lira afirmar que não pautaria nenhum pedido de impeachment, a pressão aumentou muito. Alguns partidos se reuniram em torno da questão. O PSDB tornou público a sua decisão de ser oposição. Ficou claro e até Bolsonaro percebeu que a manutenção dos ataques, culminaria em sua destituição.

Na seara econômica a pressão não é diferente. Hoje, 10, a deverá ser divulgado um manifesto pela democracia articulado pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), que vazou e foi arquivado para ser tornado público, em que mais de duas centenas de entidades cobram estabilidade e respeito à democracia.

Bolsonaro sempre instigou que os caminhoneiros para que parassem, fechassem rodovias. Foi um dos articuladores da greve do setor, em 2018. Uma parte da categoria fechou dezenas de rodovias federais em pelo menos quinze estados. O risco de desabastecimento e consequentemente aumento inflacionário é real, o que culminaria ainda mais na queda de apoio ao governo. Bolsonaro têm limitações intelectuais, mas tem grande percepção política. Sabe que o movimento que sempre apoiou, poderia acelerar a sua queda. Por isso, o desespero em encerrá-lo.

Em linhas gerais, tentou-se um golpe que não se mostrou em nenhum momento viável. As instituições via regra do sistema de freios e contrapesos funcionaram. Bolsonaro foi novamente enquadrado. Mais uma vez, como já dito aqui, o mundo real se impôs aos devaneios bolsonaristas.

Vale o registro que recuos fazem parte de estratégias. Jair Bolsonaro não é por natureza um apaziguador, nunca foi e nem será. “Voltou uma casa”, mas avançou novamente várias. Esse é o modus operandi bolsonarista. A ver.

Henrique Branco

Formado em Geografia, professor das redes de ensino particular e pública de Parauapebas, pós-graduado em Geografia da Amazônia e Assessoria de Comunicação. Autor de artigos e colunas em diversos jornais e sites.

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