Da infância jurunense ao Colosso do Bengui

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Hoje (06), o Estádio Olímpico do Pará (EOP), conhecido popularmente como “Mangueirão” (referência dada pelo cronista esportivo Moacir Calandrini) completa 41 anos de história. O estádio surgiu do desejo do então Governador do Estado, Alacid Nunes, em criar uma praça de esportes com capacidade para 120 mil pessoas. Em 1969, o projeto assinado pelo arquiteto Alcyr Meira começou a dar vida à ideia do governador. Sua construção iniciou em 1971 e em 1975 já era registrado pelos jornais jogos que aconteceram no estádio, tendo a sua conclusão finalizada em 1978.

Cresci – como toda criança que jogava bola na rua – alimentando a vontade de assistir a um jogo de futebol no Mangueirão, também chamado de “Colosso do Bengui”, mas naquela época, em meados dos anos 90, a região do entorno do estádio vivia o auge do processo de expansão urbana; e eu morava no Jurunas, na outra ponta da cidade, bairro colado ao rio Guamá. Além da limitação financeira, não havia alguém que pudesse transmitir confiança aos meus avós para que me deixassem ir ao tão sonhado estádio. Então, restava-me o rádio, que confesso era o maior barato, pois para uma criança, a voz retumbante mexia com a imaginação, que a minha sempre foi agitada. Escutava a transmissão em sua íntegra, sentado no chão da sala, próximo ao meu avô, um remista fervoroso, que sempre ocupava o único móvel que tinha na sala, um sofá de dois lugares com diversas almofadas para tapar o afundamento que tinha, pelo tempo de uso sem manutenção.

Quem só escuta uma transmissão de futebol pelo rádio, só percebe o “enfeite” dado pelo narrador, quando assiste a uma partida no estádio. Quanta diferença. O delay é o inverso. O ao vivo é mais lento do que a ação narrada pelo rádio, sendo essa é a magia deste referido meio de comunicação. Fui, digamos Paysandu até os meus oito anos, por conta da convivência que tive com a família de meu pai, todos bicolores. Aos oito me apresentaram pela primeira vez o presente que ganhei em meu aniversário de um ano: uma camisa do “uma lista branca, outra lista azul…” em tamanho real para uma criança que completava o seu primeiro ano de vida (iniciativa de minha família paterna, talvez prevendo a futura mudança de interesse e a ida para o lado do maior rival, pela convivência futura que teria). A tática emotiva não foi suficiente para impedir mais à frente a minha mudança na cor azul da camisa, que passou a ser mais escuro.

A vida dá voltas… E me aproximei novamente da minha família materna (filho de pais separados tem disso, vai pra lá, vem pra cá), e quase por inércia ao Clube do Remo, time de coração de meu avô, com o resto da família toda remista. A exceção era o meu tio Aldecy, um taxista gente boa, e que tinha uma adoração ao time da travessa Curuzú. Oficialmente aos 10 anos, em 1993, assumi a torcida pelo Remo, e quase fui deserdado por meu pai, que claro, não aceitava tal decisão. Não a aceita até hoje.

A primeira vez que entrei no Mangueirão foi em abril de 1996. Jogo do Clube do Remo contra o Corinthians. Era um presente de aniversário adiantado, pois ficaria mais velho no mês seguinte. Era a partida de volta das quartas de final da Copa do Brasil. No primeiro encontro entre os times, em São Paulo, o jogo havia terminado com o placar zerado. No Mangueirão o Remo abriu o placar e manteve a vantagem até os minutos finais. E justamente na minha estréia como torcedor no Mangueirão, a partida ficou marcada negativamente na história do clube. A bola que insistentemente rondava a área do Remo já não parecia mais levar perigo, eram os minutos finais, e os torcedores estavam eufóricos (inclusive eu, que até aquele momento estufava o peito com orgulho de ter trazido sorte na minha estréia no estádio).

Numa fração de segundo, um chute atabalhoado do atacante Castor culminou em um gol contra antológico, inacreditável, no último minuto da partida. Os próprios jogadores do time adversário não acreditavam no que tinha acabado de acontecer. O estádio virou um cemitério. Silêncio total. Todos se olhavam. Olhei para o meu lado esquerdo e vi meu tio Edivaldo indo às lágrimas. Eu nem consegui chorar, fiquei sem ação. Só queria entender o por quê? O pior veio depois quando me chamaram de “pé-frio” e “azarento” por ter ido pela primeira vez ao Mangueirão, e ter acontecido aquilo. Talvez se não estivesse lá, o Remo não seria desclassificado? Futebol é mítico… Coisas de torcedor.

Em sumo, fui poucas vezes ao Estádio Olímpico do Pará. Por um longo período o Remo mandava os seus jogos em seu próprio estádio, o Baenão, e por lá fui por diversas vezes. Até joguei nele quando treinava no sub-15 do Remo, nos campos do Exército, no 2º Batalhão de Infantaria de Selva. Mas a minha aventura de jogador de base não durou muito. Era muito ruim. Só era o “bom” quando jogava na rua de casa e a bola era minha. Não saia nunca do time e ainda era o capitão.

Em 2002, o Mangueirão iniciou o seu processo de modernização. A sua lendária “geral”, próximo ao campo, em que os torcedores assistiam aos jogos em pé, foi extinta. Deu lugar a um moderna pista de atletismo, colocando o estádio paraense entre os melhores para a realização de campeonatos da referida modalidade. O Estádio Olímpico do Pará é dono do maior público da América Latina em um GP de Atletismo (42.640 pessoas). Atualmente, o Mangueirão tem capacidade para 45.007 espectadores, bem abaixo de décadas anteriores, em que passava-se dos 50 mil torcedores.

O estádio carece de atenção e cuidado. Recentemente, foram feitos alguns reparos emergenciais, após o episódio em que um pedaço de reboco do teto caiu sobre a arquibancada. Por sorte, o estádio estava vazio. O governador Helder Barbalho em vistoria recente, afirmou que o Estádio Olímpico do Pará passará por uma ampla reforma, algo que não acontece há quase duas décadas.

Então, deixo aqui registrado uma breve passagem de minha infância e a relação criada – via futebol – entre um menino e um estádio. Talvez volte ao tema, há outras histórias que, modéstia a parte penso que sejam interessantes. Portanto, posso dizer que fui torcedor dos dois maiores times do Pará, e no final, optei em ficar pelo melhor ou maior (só para gerar polêmica). Que o nosso querido “Mangueirão” seja preservado, pois a ele há histórias interessantes, muito melhores que a minha.

 

 

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