Registros mostram alterações em barragens da MRN no Pará. Quilombolas e ribeirinhos temem desastres

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A Mineração Rio do Norte, controlada por um pool de grandes mineradoras globais, hoje liderada pela trader suíça Glencore, é a maior produtora de bauxita, matéria prima para a fabricação de alumínio, do Brasil. Está encravada em Oriximiná, no Pará, município maior que a área de Portugal, localizado na fronteira com Roraima e o Amazonas e dentro da Floresta Nacional Saracá-Taquera. A produção anual de 12,5 milhões de toneladas de bauxita da MRN, exportada para três continentes, porém, depende de um enorme complexo de 29 barragens de rejeitos que levanta suspeitas e gera medo nas comunidades quilombolas e ribeirinhas vizinhas às operações da mineradora.

Informações inéditas obtidas via Lei de Acesso À Informação (LAI) pelo Observatório da Mineração comprovam que, desde 2017, várias barragens da MRN tiveram alterações no Dano Potencial Associado (DPA) e na Classificação de Risco (CRI) na ANM. Foram impressionantes 50 alterações nas informações prestadas ao longo dos últimos anos, somadas todas as mudanças, o que levanta dúvidas sobre a confiabilidade dos dados, da fiscalização e da segurança das estruturas. Acesse todas as alterações de DPA e CRI da Mineração Rio do Norte.

A lista dos alteamentos (expansões) de barragens da MRN, também inédita e obtida pelo Observatório da Mineração, mostra que algumas barragens da mineradora passaram por “alteamento a montante”, o método menos seguro e depois por “linha de centro” ou “etapa única”, considerados mais seguros. Veja a lista completa de alteamentos. As informações são extremamente relevantes por revelarem, pela primeira vez, como as estruturas passaram por alterações nos últimos anos e que a narrativa da mineradora para as comunidades tem vários problemas.

A análise de documentos da MRN dos últimos anos, como os PAEBM (Plano de Ação de Emergência para Barragens de Mineração), atualizados frequentemente, os Dam Break, estudos de ruptura hipotética e estudo de impacto ambiental das diversas barragens e da expansão do projeto em Oriximiná também mostram uma variação enorme no reconhecimento ou não nos riscos que as barragens representam para as comunidades.

É o caso dos impactos para o Quilombo Boa Vista, nos PAEBMS de 2018 e 2020 das barragens Água Fria e A1, e das comunidades ribeirinhas no caso das barragens TP1 e TP2, analisando o PAEBM 2018 e os estudos de ruptura hipotética de 2021. As comunidades estão, pouco a pouco, sendo invisibilizadas nos estudos da MRN, com diferenças significativas na forma como os potenciais riscos e impactos são reconhecidos ou não e foi constatado a ausência de medidas de emergência necessárias em caso de ruptura nos estudos mais recentes.

MRN diz que barragens são seguras. Lideranças e pesquisadores questionam

Procurada para comentar, a MRN afirmou que seus reservatórios estão seguros e que cumpre todos os requisitos da lei no diz respeito ao Plano de Ação de Emergência para Barragens de Mineração (PAEBM) da empresa. Além disso, a MRN diz que “respeita e tem canais permanentes de diálogo com as comunidades circunvizinhas ao empreendimento”. A ANM disse que está finalizando relatórios sobre as barragens da MRN de uma fiscalização feita em agosto de 2023.

Segundo a MRN, em 2021, foram feitos novos estudos de dam break por consultores independentes, onde ficou evidenciado, que no cenário de simulação de ruptura das barragens Água Fria e A1, não haveria nenhuma casa de comunitário inserida dentro da Zona de Autossalvamento (ZAS). Com isso, o PAEBM (Plano de Ação de Emergência de Barragem de Mineração) foi adequado, não havendo a necessidade de nenhum comunitário sair de sua residência durante a simulação prática de uma emergência de barragem de mineração.

A MRN alega ainda que “desconhece episódios de contaminação de cursos de água que podem ser impactados por suas operações”.

Brechas em estudos e no discurso da mineradora geram dúvidas

Segundo Guilherme Gemaque, as constantes mudanças de funcionários dificultam que as pessoas confiem na avaliação da MRN. Além disso, diz o morador, em reuniões passadas houve o reconhecimento de que a comunidade de Saracá corria riscos e que as barragens eram construídas a montante. Em análise preliminar sobre os estudos da MRN feita a pedido da reportagem, o engenheiro Euler de Carvalho Cruz, mestre em metalurgia, alerta que o cenário de chuvas intensas consideradas no documento da MRN é “extremamente questionável” devido às mudanças climáticas.

Ainda segundo o engenheiro, ao constatar que o estudo da MRN afirma que a hipótese de falha por liquefação das barragens está “descartada” e “não é crível em nenhum cenário”, é preciso investigar por que isso não seria possível. A liquefação foi o mecanismo de ruptura responsável pelos rompimentos de Mariana em 2015 e Brumadinho em 2019.

Mineração Rio do Norte

A história da empresa teve início com a descoberta pela Alcan, em 1967, das primeiras ocorrências de bauxita. Naquele mesmo ano, em 5 de junho, foi constituída a Mineração Rio do Norte para lavrar, beneficiar e comercializar a bauxita da principal jazida, denominada Saracá. As atividades operacionais só começaram em 1979, com capacidade para produção de 3,35 milhões de toneladas e vendas garantidas aos seus próprios acionistas por meio de contratos de longo prazo. O primeiro navio carregado com minério partiu com destino ao Canadá, no dia 13 de agosto de 1979. A capacidade de produção cresceu ao longo nos anos, em função do aumento da demanda de mercado e da ótima aceitação da bauxita produzida pela MRN pelas refinarias de todo o mundo. Entre 2001 e 2003, a empresa investiu US$ 223 milhões em um grande projeto de expansão. Com isso, a capacidade instalada de produção saltou de 11 milhões para 16,3 milhões de toneladas de minério nesse período e, atualmente, sua produção atinge 20 milhões de toneladas produzidas.

Com informações de Observatório da Mineração (adaptado ao Blog do Branco).

Imagem: reprodução Internet. 

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