Na retomada das atividades do Congresso Nacional, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem um grande desafio pela frente, em mais um duro teste para sua articulação política: tentar diminuir a pilha de 20 Medidas Provisórias (MPVs) que estão pendentes de votação, muitas das quais próximas de perder a validade, o que pode levar ao trancamento da pauta dos plenários das Casas legislativas.
As MPVs são editadas pelo presidente da República em assuntos considerados relevantes e urgentes para o país, nos termos do que determina a Constituição Federal. Elas produzem efeitos imediatos – valem ao mesmo tempo em que tramitam no Parlamento, salvo quando há indicação contrária (como no caso de matérias de natureza tributária) –, mas dependem de aprovação da Câmara dos Deputados e do Senado Federal para que, efetivamente, se transformem em lei. O prazo de vigência de uma MPV é de 60 dias, prorrogáveis por mais 60. Entretanto, se não tiver sido votada depois do 45º dia de sua publicação, ela tranca a pauta da Casa na qual estiver tramitando.
Assim que chega ao Congresso, a MPV é analisada por uma comissão mista (formada por deputados e senadores), que aprova um parecer sobre o projeto. Caso o texto original seja modificado, a MPV passa a tramitar como projeto de lei de conversão (PLV). Depois de o parecer ser aprovado na comissão mista, o texto é encaminhado para o plenário da Câmara e, na sequência, para o do Senado. Com a aprovação em ambas as Casas legislativas, o texto é enviado à Presidência da República para sanção. O chefe do Executivo pode vetá-lo parcial ou integralmente – todos os vetos devem ser analisados pelo Congresso, que pode derrubá-los. Caso a MPV seja aprovada sem alterações pelos parlamentares, ela é promulgada automaticamente, sem retornar ao Palácio do Planalto. Desde que tomou posse, Lula já editou 51 MPs – muitas “caducaram” (ou seja, perderam a validade sem serem analisadas).
Também foi incluída no texto da MPV a revogação do Programa Emergencial de Retomada dos Setores de Eventos e Turismo (Perse), criado em 2021 para socorrer o setor de turismo e eventos, um dos mais atingidos pelos efeitos econômicos da pandemia de Covid-19. O texto prevê a volta da cobrança da CSLL, do PIS/Pasep e da Cofins para os setores hoje beneficiados já a partir de abril deste ano, cumprindo a noventena exigida pela Constituição. A retomada da incidência do IRPJ, por outro lado, ocorreria somente em 2025, dada a necessidade de atendimento ao princípio da anualidade − ou seja, a regra só pode valer no exercício seguinte ao de sua aprovação. O fim do Perse é outro ponto de atrito entre Executivo e Legislativo.
“O Congresso já se posicionou de forma contundente contra o fim da desoneração. Foi um debate extenso e que encontrou ampla convergência nas duas Casas. Se o governo quiser evitar uma derrota retumbante, precisará negociar uma saída alternativa, que preserve a decisão dos parlamentares”, observa Fábio Zambeli, vice-presidente da consultoria Ágora Assuntos Públicos.
Para o cientista político Vítor Oliveira, diretor da consultoria Pulso Público, a MPV da Reoneração “já nasceu morta”. “A negociação está apontando que ela pode sobreviver apenas com resquícios do que era a proposta inicial. Temos um Executivo que está precisando escolher as batalhas – e essa é uma que tem uma diferença muito grande entre o que o Executivo quer e o que o Congresso quer”, aponta.
Além da reoneração da folha, integram o grupo de MPVs pendentes de votação a prorrogação do Desenrola Brasil (programa de renegociação de dívidas que beneficiou mais de 11 milhões de pessoas até janeiro); o auxílio extraordinário para pescadores beneficiários do programa Seguro-Defeso; e a instituição do Programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover), que concede créditos usados no abatimento de tributos para empresas que investirem em pesquisa e tecnologia na produção de veículos “sustentáveis”. Outras dez propostas abrem créditos extraordinários para diversos órgãos públicos, somando mais de R$ 96 bilhões. A maior parte desse valor (R$ 93,1 bilhões) está destinada para a quitação de precatórios (MP 1.200/2023). Sete dessas dez proposições liberam R$ 1,9 bilhão para o combate a desastres climáticos.
Com informações de Congresso Em Foco.
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