Vereadora, vice-prefeita de Belém, deputada federal, senadora e governadora do Pará. Essa é a escalada política de Ana Júlia Carepa. Um currículo que poucos podem ostentar. No caso do gênero feminino no Pará, não há outra biografia política que se assemelhe a da ex-petista.
Pois bem, Ana Júlia está deixando o PT, depois de ter sido uma das fundadoras da legenda no Pará. A cerimônia de sua filiação está sendo organizada para ser um grande evento político. O governador do Maranhão, Flávio Dino (o segundo melhor governador do país segundo pesquisas de avaliação) confirmou presença.
A mudança ocorreu por diversos fatores. Primeiro, o desgaste da ex-governadora dentro do seu próprio partido. A sua tendência interna, a DS (Democracia Socialista) mante-se deslocada internamente dentro da legenda. A DS tornou-se forte, com poder de comando quando Ana Júlia foi eleita governadora, derrotando com o apoio dos Barbalhos, o PSDB que tinha naquele momento o retorno do finado Almir Gabriel para o embate eleitoral, depois de um período longo de reclusão em Bertioga, interior de São Paulo.
Segundo, a própria forma de como o PT tratou a figura política de Ana Júlia e os feitos de seu governo. Desde 2011 a ex-governadora se queixava da renúncia do Partido dos Trabalhadores na defesa de sua gestão, até porque o governo não era dela ou da tendência que integrava, mas de todo petista e grupos políticos apoiadores. O que ajudou a reforçar o estigma de uma péssima gestão, haja vista, que não havia o contraditório ou a réplica de defesa. Parecia que tudo era creditado na conta da ex-mandatária da política paraense.
Até 2010 Ana Júlia era a maior estrela da DS, reinava absoluta, tinha a sua sombra a sua comadre Edilza mas logo em seguida Claudio Puty (até então um militante mais distante do cotidiano do partido, de perfil acadêmico, tinha tornando-se doutor pouco antes do PT vencer a eleição para o governo do Estado) chegou. E de forma meteórica assumiu a Secretaria de Governo (Segov – uma reunião de Câmaras Setoriais), para em seguida torna-se o “número dois” do governo com o controle da Casa Civil. No posto, sem cerimônia, concentrou diversos programas de governo, pavimentando assim a sua candidatura a deputado federal.
O PT foi derrotado nas urnas, mas Puty estava bem. Seu projeto político tinha sido vitorioso. Parecia na campanha de 2010 que era mais importante eleger para a DS um deputado federal do que se manter no governo do Estado. O destino quis que ambos sem encontrassem em 2014, Cláudio Puty e Ana Júlia, ambos para federal, dividindo votos dentro da minúscula DS. O resultado era o esperado: ambos derrotados eleitoralmente pelo próprio autofagismo que se colocaram. Depois o PT foi desidratando político-eleitoralmente em todo território paraense.
O cenário político
Claramente, Ana Júlia está indo para o PCdoB em busca de espaço político-eleitoral. Os comunistas também a querem. Para o próximo pleito já estará valendo a cláusula de barreira, ou seja, o PCdoB precisará de votos. Pela proposta, a partir da eleição de 2018, só terão acesso ao fundo eleitoral e à propaganda eleitoral gratuita no rádio e na TV partidos que preencham os seguintes requisitos: obtenham ao menos 1,5% dos votos válidos na eleição para a Câmara, distribuídos por ao menos nove Estados (com mínimo de 1% dos votos em cada um desses Estados); ou elejam ao menos nove deputados vindos de pelo menos nove Estados. Isso sem coligação, o que dificulta ainda mais os partidos pequenos de obterem quociente eleitoral.
No caso de Ana Júlia, a ex-governadora será a “puxadora” de votos da legenda. Por isso, não há outra possibilidade política que justifique a sua ida ao PCdoB que não seja pleitear uma das 17 cadeiras da bancada federal paraense no Congresso. Recente pesquisa colocou Ana Júlia em segundo lugar na consulta para o governo do Pará, o que agitou a esquerda paraense. Voltar a disputar o Palácio dos Despachos não está nos planos dela e de seu novo partido. O partido quer representação política em Brasília. Em novo front de batalha, com nova oxigenação ideológica, sem as amarras de antes, a ex-governadora poderá obter êxito em sua nova empreitada política. Ana Júlia está de volta ao embate.
Como seu amigo pessoal, por telefone lhe desejei sucesso e vitórias em sua nova “casa” e caminhada. Abaixo reproduzo na integra a sua carta de despedida do PT e ingresso ao PCdoB.
“O ataque das elites aos direitos e conquistas sociais dos trabalhadores requer a unidade de todos os setores que defendem a transformação social.
Este documento registra a decisão de filiação partidária ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB) de Ana Júlia Carepa.
Venho a público anunciar a minha filiação partidária ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB), agremiação política com mais de 90 anos de fundação no Brasil, cuja história de lutas em defesa dos direitos sociais e da democracia, se confunde com a própria história do Brasil. Ao longo desse período o PCdoB se manteve na vanguarda dos interesses da maioria da população, mesmo tendo as forças conservadoras impostas ao partido, uma clandestinidade de mais de 60 anos. O PCdoB nunca abandonou seus ideais e sempre atuou na defesa da Democracia, dos trabalhadores e do bem-comum da população. E como elemento essencial nesta minha decisão, a recente aprovação pelo Congresso da cláusula de barreiras já para as eleições de 2018, o que ameaça a existência do PCdoB! Estes certamente foram os fatores que pesaram na minha decisão de aceitar este desafio.
Não posso negar a importância do Partido dos Trabalhadores na minha formação política. Ingressei no partido há cerca de 30 anos e durante essas quase três décadas acumulei um legado que levarei por toda a vida. O PT me confiou a liderança de importantes projetos em defesa de mudanças pelas quais lutamos e nos propusemos a implementar, quando à frente de mandatos. É essa formação e experiência que levo para o PCdoB, com o compromisso de buscar fazer cada vez mais pela manutenção das conquistas alcançadas e pelo restabelecimento da conquista da democracia.
Expresso aqui a minha gratidão, de coração, a todas e todos do Partido dos Trabalhadores que contribuíram, em diversas lutas e campanhas vitoriosas, eleitoralmente ou politicamente, que, independente de seus resultados, foram grandes aprendizados. Em diversas batalhas fui honrada e credenciada pela militância petista, e de outros partidos, como referência pública nas disputas parlamentares e nos vitoriosos mandatos executivos de vice-prefeita de Belém e governadora do Estado do Pará. Antes cumprimos com mandatos de vereadora de Belém, (dois mandatos), deputada federal, e Senadora. Além das campanhas em apoio a outras candidaturas de Prefeito, Governo e de Presidente da República.
O ataque dos setores conservadores às políticas públicas de inclusão e afirmação social são promovidos em todos os segmentos: religiosos, sindicais, ambiental, educacional, cultural, gênero, partidários e outros. O crescimento do fascismo no Brasil nos faz refletir Gramsci que constatou, ao analisar a conjuntura italiana: “O fascismo apresentou-se como antipartido, abriu as portas para os candidatos; e, prometendo a impunidade, permitiu que uma multidão informe cobrisse com um verniz de idealismo político vago e nebuloso o transbordamento selvagem das paixões, dos ódios, dos desejos.”
Os setores conservadores avançam com as mais absurdas, desumanas e excludentes concepções de um projeto societário alicerçado em princípios fascistas criminalizando a CUT, PT, MST, PCdoB, PCB e demais agrupamentos e organizações de esquerda, dentre outras organizações sociais dos trabalhadores e das minorias que lutam pela garantia dos avanços conquistados nos governos democrático popular do País e no Estado do Pará. E para isto estes setores tenebrosos contam, infelizmente, com o apoio e parceria dos Governos do Pará e do Brasil!
No Pará assistimos os Governos estadual e municipal do PSDB acabar com politicas públicas de inclusão social. O fim de politicas para juventude como: Bolsa Trabalho, os Infocentros do Navega Pará, quase todos fechados, o fim do programa “Escola de Portas Abertas”, o fim da distribuição de uniformes e material escolar nas Escolas estaduais, entre outros. Presenciamos também um descaso com o combate a violência, onde assistimos o pavor com que vive a nossa população com assaltos e sequestros incontroláveis, além do crescimento de milícias, a violência no campo retorna desenfreadamente, a exemplo do que ocorreu na chacina no município de Pau d’arco, culminando com a morte de dez trabalhadores rurais na fazenda Santa Lúcia. A propalada eficiência na gestão, presente apenas nas propagandas. Melhor exemplo, são as obras viárias. Nosso Governo em 3 anos fez toda a 1a etapa do Ação Metrópole, construindo o Elevado da Júlio César, as 4 Rotatorias, a nova Av. Centenário, a Revitalização da Artur Bernardes, com ciclofaixa e nova ponte do Paracuru, duplicação da Transmangueirão, duplicação de 1Km da Perimetral com reconstrução do Terminal Rodoviário e nova ponte. O Governo E prefeitura do PSDB estão há mais de 6 anos para concluir o BRT. O tratamento perverso com os servidores estaduais que tem experimentado arrocho salarial, perda de direitos, piora no atendimento à saúde como o PAS do IASEP, além da ausência de concursos públicos no Estado, dentre outras.
Enfim, vivemos um retrocesso social á nível dos Governos do Pará e do Brasil, que requer unidade na luta dos trabalhadores e uma retomada de práticas partidária que consigam superar esses ataques a um sistema político e econômico baseado na igualdade, que nada mais é que o socialismo, que se manifesta como alternativa a uma sociedade humana, fraterna, justa e igualitária.
É a esse novo desafio que me apresento, com a mesma disposição de contribuir de forma mais efetiva, na defesa dos interesses sociais e coletivos, baseada nos princípios democráticos, dos quais não me afastarei em nenhuma hipótese.
Confesso que essa decisão de mudar de partido não foi fácil. Não por uma questão ideológica, mas pela história de vida que tenho no Partido dos Trabalhadores. Embora tenha iniciado minha militância política no PCdoB ainda no Movimento Estudantil, no Movimento Comunitário e de Mulheres, foi no PT onde reafirmei minhas convicções.
O coração aperta, mas a certeza de trilharmos juntos o mesmo caminho no restabelecimento do Estado Democrático de Direito, na defesa do companheiro Lula e da companheira Dilma, perseguidos de forma implacável por uma elite que sempre assaltou o Estado e reage de forma raivosa, pregando o ódio contra os mais pobres que começaram, também, a ter acesso a direitos que antes eram quase que exclusivos da elite.
Na missão que me couber nas próximas batalhas, estaremos defendendo os mesmos princípios democráticos e de combate ao obscurantismo atual, bem como, no esforço acender a chama da esperança no coração de cada homem, mulher, jovem, criança e idoso deste Pará e deste Brasil, na esperança de voltarmos a ser UM BRASIL DE TODAS E TODAS!
Concluo citando um grande lutador, jornalista, escritor, o poeta latino-americano que é o Eduardo Galeano. Ao falar sobre o sentido da nossa luta e para que serve a utopia respondeu: “A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar”! (citando o cineasta Fernando Birri).
Na Luta Sempre, Camaradas!
Ana Júlia Carepa.