O grupo político conhecido como centrão saiu fortalecido do primeiro turno das eleições municipais do último domingo (6), como analisaram os cientistas políticos Ricardo de João Braga e Graziella Testa em live do Congresso em Foco nesta segunda (7). Para eles, as campanhas do pleito frustraram expectativas, com apoio discreto tanto do presidente Lula quanto do ex-presidente Jair Bolsonaro.
A polarização esperada, como avalia Braga, não se concretizou, “isto é, a eleição não ficou definida por um grupo bolsonarista e outro lulista”. “Mas, quando a gente fala de polarização, a perspectiva, a dimensão direita e esquerda ainda é forte, talvez tenha ficado mais importante para as eleições. E o ponto é que quando o pessoal fala em centro e centrão, é porque eles estão entre esses extremos, mas ideologicamente eles não estão no centro, estão à direita”, explica ele.
Segundo o especialista, os partidos do centrão se orientam, agora, como centro-esquerda e centro-direita, o que implica, inclusive, nas dificuldades de articulação desse terceiro governo Lula, “porque há um ‘descasamento’ ideológico entre o núcleo da coalizão e seus aliados necessários, que é esse centrão”.
A pesquisadora da Fundação Getúlio Vargas em Brasília (FGV), Graziella Testa, pontua que o centrão atualmente, ou o “centrão 2.0”, é muito diferente do grupo que se formou durante a Constituinte, ainda que carregue algumas das características mais conservadoras de sua contrapartida. Desde o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, o centrão se comporta de uma forma fisiológica, ou seja, em uma relação política em que ações e decisões são tomadas em troca de benefícios a interesses privados.
“Esse centrão pode ter uma orientação conservadora, se isso render algum tipo de dividendo em termos de voto, mas a principal característica dele é o fisiologismo, a estratégia. Então, abrir mão de pautas que são ideológicas em prol do governismo. Nesse sentido, é mais interessante na formação de coalizão, na construção de governo, ter alguém ligado ao centrão do que ter alguém, por exemplo, do PL”, pondera a pesquisadora.
Graziella aponta um “fortalecimento muito claro, evidente, do PSD, um crescimento menor do que o esperado em relação ao PP e um resgate do MDB, no sentido de sigla tradicional, que vinha sofrendo nos últimos pleitos”.O PSD, o MDB, o PP de Arthur Lira (AL) e o União Brasil elegeram mais de 3 mil prefeitos no primeiro turno, ou 54% dos municípios. A sigla de Gilberto Kassab viu um aumento de 35%, enquanto MDB e o PP subiram 8%. Criado em 2021 do casamento entre o DEM e o PSL, o União Brasil disputou o primeiro pleito municipal.
PT x PL
No quantitativo de votos para prefeitos, o PL é a legenda que recebeu a maior soma de votos, com mais de 15,7 milhões. O PT ficou na 6ª posição no número total de votos para prefeitos e no 9º no total de prefeitos eleitos, um desempenho melhor que o de 2020, o pior resultado em eleições municipais.
Para a professora da FGV, os petistas adotaram uma estratégia de abrir mão das chapas, em troca de apoio aos aliados, mas observa que com uma coalizão mais “fluída” e com o Legislativo fortalecido pela centralização do processo decisório neste Poder, é mais interessante ao governo federal consolidar apoio de olho em 2026.
“Um parlamentar tem muitos incentivos para buscar o apoio do presidente da Mesa, mas poucos incentivos para procurar o presidente da República, o que dificulta a formação de coalizão e de fato pode gerar questões mais sérias. Nessas eleições, o Lula e o PT não tinham tudo aquilo a disposição, os recursos que outros presidentes já tiveram”, comentou Graziella.
Uma possível razão para o desempenho de PT e PL seria a de que o “eleitorado andou para a direita”. “O mundo está mudando, estamos emaranhados em dilemas sociais. (…) É bem mais fácil fazer a política conservadora, que é ‘o que está aí é para ser preservado’. O status quo de poder, de normas, de relações sociais está aí para ser preservado”, opinou Braga.
“No caso da esquerda, se você for olhar a socialização política é feita de outra forma. Existe aquela hierarquia, aquele catecismo, aquela formação, então é muito mais difícil. (…) Hoje a esquerda não tem um projeto para apresentar que movimente corações e mentes”, acrescentou ele, citando problemas econômicos, ambientais e de segurança como questões que atrapalham a adesão dos eleitores.
Por Andrea Malcher – Congresso Em Foco
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