Impeachment como obrigação moral

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O assunto mais falado como consequência da tragédia que o Brasil vive na pandemia – aprofundado com o caos que Manaus vive atualmente – é o impeachment do presidente Jair Bolsonaro. Neste momento, há 61 pedidos de afastamento do mandatário da nação. Pela Constituição Federal, quem tem o poder e a autorização de iniciar qualquer processo de impedimento de um presidente no Brasil é quem preside a Câmara de Deputados, neste caso, Rodrigo Maia (DEM).

Bolsonaro completou dois anos de seu mandato presidencial, e, neste período, já cometeu 22 crimes de responsabilidade, segundo o jornalista Reinaldo de Azevedo, o que seria mais do que suficiente para afastá-lo do cargo. Se o presidente da Câmara dos Deputados aprovar o pedido de impeachment, ele será despachado à Comissão Especial, que será formada dentro de 48 horas. Admitido o pedido, o denunciado é comunicado e tem até 10 sessões para se manifestar.

O pedido é lido na sessão seguinte da casa, pela Comissão Especial, que a partir da manifestação do denunciado, tem o prazo de 5 a 10 sessões para oferecer o parecer, que será lido no expediente seguinte da Câmara. Após 48 horas da publicação do parecer no diário oficial da câmara, ele será incluído na ordem do dia da sessão seguinte. Na sessão, o parecer é submetido à votação dos deputados. Sendo o parecer aprovado na votação, a Câmara apresenta denúncia ao Senado, que cuidará do julgamento.

Então, por que, Rodrigo Maia não aceita um das dezenas de pedidos que estão em sua gaveta? A questão como já tratada neste blog é numérica. Na Câmara precisa-se ter 2/3 dos deputados, ou seja, 342 votos, para que Jair Bolsonaro seja afastado do cargo por até 180 dias, prazo limite de seu julgamento, este sob responsabilidade do Senado Federal, com o mínimo de 54 votos, para que seja afastado em definitivo e o vice-presidente, Hamilton Mourão, assuma.

A questão é: se tem 342 votos entre os deputados federais para encaminhar o processo de impeachment? A resposta é não. Portanto, a chance de levar o processo até o seu julgamento de fato (Senado) é pequena. Mesmo assim, sem maioria e com risco de arquivamento, iniciar o processo de impeachment de Jair Bolsonaro tornou-se – pelas circunstâncias atuais e o histórico desde o início de seu mandato – uma questão moral. Tamanho é o seu descaso em relação à saúde pública.

O presidente mostra-se incapaz de continuar a conduzir o país. A não aceitação do pedido de impeachment meramente por falta do número mínimo já não pode ser a justificativa, nem a de que se iniciar o processo e ele não prosperar, fortalece Bolsonaro. O Brasil merece (pelo bem de sua democracia e em respeito as duas centenas de milhares de mortos por Covid) que seja aberto um processo de impedimento contra o presidente.

Mudou o critério para aceitação do processo de impeachment no Brasil? Fernando Collor e Dilma Rousseff sofreram por muito menos (dentro do enquadramento legal da Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950) do que, por exemplo, os crimes de responsabilidade que Jair Bolsonaro já cometeu. Solicitar ou aceitar um pedido de impedimento, desde que esse pedido esteja enquadrado legalmente, não é atentar contra a democracia. É defendê-la e manter o Estado de Direito funcionando.

Manteremos até o fim de 2022 um presidente incapaz de governar o país? Que prega o negacionismo; ataca a Ciência; isola o Brasil no plano da política internacional; que pela instabilidade de seu governo, afasta investimentos e que tornou o país um caos.

Mesma sem a garantia numérica, o impeachment tornou-se uma obrigação moral. Caso contrário, quem hoje detém o poder de colocar o processo em curso e não o fizer, entrará para a História como cúmplice.

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