Sobre games, violência e imbecis…

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No País de Alice…

No país das soluções simples para as questões complexas, temos mais um episódio, surgido da tragédia de Suzano. Dois IMBECIS invadiram uma escola e assassinaram vários estudantes, de maneira covarde e gratuita. No meio do ‘achismo’ que hoje é moda no Brasil, já temos um culpado: os videogames.

Os videogames estão sendo apontados (inclusive pelo vice-presidente da república) como incentivadores da violência que explodiu em Susano.

Mas até que ponto isso é verdade? Vamos os números…

Com mais de 2,3 bilhões de jogadores no mundo todo, os jogos eletrônicos hoje já movimentam mais dinheiro do que o cinema e a música – juntos. De acordo com relatórios da indústria, os games foram responsáveis por injetar na economia mundial, quase 140 bilhões de dólares em 2018. O cinema, por sua vez, movimentou pouco mais de US$ 39 bilhões; a Música, US$ 17 bilhões.

Tabela comparativa ou Tabela da Hipocrisia. Japão x Brasil, 2018. Videogames e violência

Os jogos mobile, aqueles para celulares e tablets, já são mais da metade da indústria global de jogos; no Brasil, 84,3% dos jogadores preferem os smartphones. Segundo a Anatel, são mais de 240 milhões de linhas ativas no País – ou seja, mais de um aparelho por habitante. Com números tão impressionantes, não dá para negar que os jogos eletrônicos já são um fenômeno cultural bem consolidado. Hoje em dia, todo mundo joga algum jogo. A pergunta que fica é: “quantos desses 2,3 bilhões de jogadores espalhados pelo mundo se tornaram maníacos homicidas”?

No Brasil, a mesma coisa. O mercado de games brasileiro, embora considerado emergente, é um dos maiores do planeta e um dos que mais cresce. Agora uma pesquisa recente do NPD Group confirmou isso: a grande maioria da população jovem e adulta do país é consumidora de games, nas suas mais variadas formas.

Uma pesquisa feita pela Zewzoo, empresa de estudos de mercado focada em jogos digitais, aponta que o Brasil tem hoje mais de 75 milhões de entusiastas e movimentou ano passado, a impressionante quantia de 1.5 bilhão de dólares! A pesquisa constatou também que os games estão entre as principais atividades dos adolescentes, jovens e adultos do país: cerca de 82% da população do país entre 13 e 59 anos joga algo nas mais diversas plataformas, sejam PCs, consoles, dispositivos móveis ou portáteis. De novo a pergunta: “quantos desses jogadores, tornaram-se maníacos homicidas”?

O que falta nessa discussão (como em várias outras) é honestidade de argumento. Em primeiro lugar, videogames não são bens de consumo baratos. Quantas pessoas têm condições de pagar por eles? E se os videogames têm essa capacidade de influenciar, o que dizer dos filmes? Como que milhões de pessoas não saíram por aí, roubando carros depois de assistir “Velozes e Furiosos”, “60 Segundos” e tantos outros? Ou tornou-se um ladrão de bancos, ou de jóias? Porque são “profissões” sempre romantizadas nos filmes de ação. Alguém consegue dizer quantas pessoas o John Rambo matou no Rambo IV? Eu posso: 236 (e ainda saiu vivo!). Quem nunca aprendeu como arrombar a porta de uma casa ou carro, vendo um filme? Ou um roteiro elaborado de como matar alguém e esconder um corpo?

Vamos fazer o que? Proibir filmes, novelas, peças de teatro (também têm violência. Vai que a pessoa sai do teatro com vontade de envenenar alguém se assistir uma peça da Grécia antiga, por exemplo).

A influência que conta é a de casa, a da escola e dos amigos. O que acontece hoje é que cada vez mais e mais pais e responsáveis querem que OUTRAS pessoas se responsabilizem pela educação de seus filhos. Por isso, elegem pessoas que dizem que vão proibir, proibir, proibir… porque educar dá trabalho! Melhor é proibir logo. Meus filhos nunca precisaram que eu colocasse senha em nada. Se eu disser “não pegue”, é não pegue e pronto!

Educar não é apenas pagar as contas e colocar horários. É estar presente, é saber o que o filho faz, com quem anda e o que pensa da vida, do mundo e das outras pessoas. A escola e o meio social têm papel muito importante, mas secundário na formação do caráter.

Mas pergunte a um professor amigo de vocês: quantos pais em média comparecem às reuniões de pais e mestres? Adoram ir pro Facebook fazer textão contra greve de professores, sobre a má influência do professor comunista, etc… mas não sabem nem dizer as notas dos filhos de cabeça!

Gente, eu já vi mais brigas acontecerem em em partidas de futebol (pelo contato físico) do que em Lan-Houses, por exemplo.

E qual o grande clássico do futebol brasileiro hoje em dia que não acaba em briga de torcidas organizadas? Muitas dessas brigas em morte? E a final da Libertadores entre os times argentinos que teve que ser realizado na Espanha pro questões de SEGURANÇA??? Vamos extinguir o futebol então, gente! Resolvido!

Outro exemplo: de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), os acidentes de trânsito atingiram a impressionante marca de 1,35 milhão de óbitos no mundo, em 2018. Apenas no Brasil, ano passado, quase 50 mil pessoas morreram em decorrência de acidentes de trânsito. Pra você ter uma ideia do absurdo desse número, basta dizer que a Guerra do Vietnã, que durou nove anos, teve um saldo de 58 mil soldados americanos; em nove anos! A gente quase alcançou este número apenas em 2018, na paz, dirigindo! Em seu relatório, a OMS afirma ainda que os acidentes de trânsito são atualmente a principal causa de morte entre crianças e jovens com idades entre 5 e 29 anos. Vamos abolir os carros então? Claramente não servimos para tê-los.

Voltando ao assunto tema deste artigo, os videogames são o reflexo de uma sociedade mais digital, mais eletrônica e globalizada. Não são causa de nada; são um eletrodoméstico, apenas. O bom uso dele vai depender do seu discernimento, como tudo na vida, aliás.

Caráter é base, é berço. Educação é isso e mais acompanhamento dos pais e responsáveis. Porque quem cresce sozinho é mato.

 

Referências: Revista Exame, Fórum Econômico, Drops de Jogos

Vicente Reis, 46 anos.
“Músico de formação, Programador e Data Scientist”. Viciado em Ópera, Jazz, e-Games, Clube do Remo e Vasco da Gama. Político Cultural, Agente Político e militante de causas perdidas.

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