O título deste artigo tem como base duas publicações da revista Veja, em dois momentos distintos. Na primeira, no auge da Operação Lava Jato, em 2015, a referida revista enalteceu ao máximo o então juiz de primeira instância, Sérgio Moro. No citado ano, a revista voltou a elevar o magistrado ao mais alto nível de reconhecimento ao produzir em uma de suas edições a seguinte manchete: “Ele salvou o ano” – com a imagem do juiz ao fundo.
Moro rapidamente tornou-se uma personalidade nacional. Associou-se a ele a imagem de um super-herói, de um justiceiro que combate à corrupção, e que salvaria o Brasil deste mal histórico. Desde o início me reservei a acompanhar os desdobramentos da Lava Jato, e já questionando-a em alguns pontos, em especial, a sua seletividade. Não demorou muito para que se perceber que havia algo além do padrão, ou seja, o modus operandi do então magistrado estava indo além dos limites do Direito Legal, ou do que rege a Constituição. Antes disso, a própria atuação dos procuradores, que foram os que apresentaram as denúncias (sem provas, resumindo-se a convicções). O caso ficou flagrante quando centrou-se no ex-presidente Lula. Diversos especialistas do Direito afirmaram que a sentença que condenou o petista é frágil e que não apresenta uma prova condenatória.
A condenação de Lula foi o ápice do reconhecimento público de Moro. Estava claro que ele não ficaria muito tempo chefiando a 13.ª Vara Criminal Federal de Curitiba. Moro nunca escondeu que o seu objetivo é ser ministro do Supremo Tribunal Federal. Conforme recentemente tornando público, ainda no período eleitoral, Moro já havia recebido o convite do então candidato Jair Bolsonaro, para ser o seu ministro da Justiça. Sabe-se que tal cargo é o caminho mais certo para sentar em uma das cadeiras da Suprema Corte.
Desde janeiro, Moro já condição de ministro, vinha passando – de forma – sequencial por altos e baixos no governo. Mas mantinha-se como um poderoso ministro a caminho do STF, talvez, em 2020, com a saída de Celso de Melo. Sua imagem até então, continuava bem avaliada perante a opinião pública. Isso até o último domingo (09).
A semana se iniciou com uma matéria produzida pelo The Intercept Brasil mostrando um vazamento de conversas trocadas pelo aplicativo Telegram entre Sérgio Moro, quando ainda era juiz, e procuradores do Ministério Público Federal. Se comprovadas as mensagens trocadas entre juiz e acusação, trata-se de promiscuidade processual no âmbito da Operação Lava Jato. Diante dos graves fatos apresentados, juristas questionam a responsabilização dos servidores públicos e possível nulidade nos processos da Lava-Jato julgados por Sérgio Moro.
Quem tenha a mínima noção do Poder Judiciário, sabe que um juiz é a figura neutra do processo. Em uma ação penal, o julgador precisa se colocar distante tanto do réu, quanto do órgão acusador, neste caso, o Ministério Público. A imparcialidade de um juiz é vital para o cumprimento das leis. Sabe-se também que o fundamento de um juiz são as provas que estão nos autos, e o que não estiver nos autos, não existe aos olhos do julgador.
O juiz não pode orientar nenhuma das partes, não pode colaborar com a investigação, nem pode participar da instrução penal. O caso divulgado pela The Intercept Brasil, não se trata apenas de desvio ético (no caso das mensagens trocadas entre Sérgio Moro e Daltan Dallagnol), trata-se sim – conforme afirmado por diversos especialistas da área – de tornar nula a investigação criminal, processo judicial e a própria sentença condenatória.
Pesquisas já apontam que a popularidade de Moro vem caindo, ou seja, sua atuação nos bastidores, que passou a ser revelada agora, não foi bem vista pela maioria da população. Minimamente, na melhor das hipóteses, ele não foi ético. O que pensar de um magistrado que não tem ética?
Recentemente, o corregedor nacional de justiça, ministro Humberto Martins, determinou neste último dia 6 de junho, o arquivamento do pedido de providências instaurado contra o ex-juiz federal Sérgio Moro para apuração de “supostas” irregularidades cometidas na época em era titular da 13ª Vara Federal de Curitiba. O caso tramitou em sigilo no CNJ e reuniu fatos controversos do ex-juiz desde 2016 até 2018. Os casos arquivados, foram tratados tanto pelos juízes do TRF4 quanto pelo corregedor como “mero inconformismo” e “alegações genéricas”.
Dentre as atos que permeavam o pedido de providências arquivados discutiam-se a atuação de Moro em três momentos políticos para o país, o impeachment, o caso Lula e as eleições de 2018 quando:
- Em março de 2016, divulgou áudios fruto de interceptação telefônicas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva com a finalidade de interferir politicamente no país;
- Em julho de 2016, agiu no período de férias, contra a ordem de um desembargador, para invalidar um habeas corpus que havia concedido que o presidente saísse da cadeia;
- Em outubro de 2018, deu publicidade a um termo de depoimento sigiloso da delação do ex-ministro Antonio Palocci em meio ao período eleitoral.
O caso chega a ser constrangedor. Moro deveria deixar o cargo de ministro, mas não o fará. Sabe que só chegará ao STF, se mantiver como ministro. Prefere ser “fritado” pela opinião pública, do que salvar a sua biografia. Foi de super-herói ao processo de desmoronamento.