Eleições americanas: o debate que Donald Trump queria

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Quando decidiu antecipar o primeiro debate dos Estados Unidos no qual um presidente e um ex-presidente se enfrentam, a campanha de Joe Biden tinha uma estratégia: fazer o democrata passar à frente de Donald Trump nas pesquisas antes de ser oficialmente nomeado. Após o confronto na CNN, ontem à noite, o que o partido se pergunta é se seria o caso de substituir Biden — e por quem — antes da convenção democrata em agosto. Se Trump foi afiado, porém profundamente desonesto, um Biden vencido pela rouquidão teve performance desajeitada, hesitante e, em alguns momentos, desconexa. Mais do que confundir palavras, como trocar trilionários por bilionários, Biden não completou frases e raciocínios enquanto tentava se lembrar de estatísticas e informações sobre seus próprios feitos. A dificuldade para concluir suas ideias foi tamanha que ele acabou falando quase cinco minutos a menos do que o republicano, embora o tempo fosse igual para os dois. Trump usou a palavra durante 41 minutos e 2 segundos; Biden falou durante 36 minutos e 12 segundos. “Eu realmente não sei o que ele disse no final daquela frase. Eu não acho que ele saiba o que disse também”, disse Trump após o adversário responder uma pergunta sobre imigração. (New York Times)

Nenhum presidente em exercício desistiu da disputa a essa altura de uma campanha, e há pouco consenso entre os democratas sobre como fazer uma eventual troca. Em sua primeira declaração após o debate, logo após a meia-noite em Atlanta, quando foi parar com sua equipe em uma lanchonete especializada em waffles, Biden disse aos repórteres que o seguiram: “Acho que nos saímos bem”. Questionado sobre as preocupações com sua exibição e os apelos para que considerasse abandonar a corrida, respondeu: “Não. É difícil debater com um mentiroso”. Ele indicou que sua voz rouca era consequência de uma “dor de garganta”. Mais cedo, seus assessores disseram que ele estava lutando contra um resfriado. (Politico)

Não são recentes os questionamentos sobre a saúde e a capacidade cognitiva de Biden. No ano passado, um importante estrategista democrata, David Axelrod, sugeriu que ele deveria desistir da reeleição. Há poucas semanas, viralizou nas redes um vídeo em que o presidente parecia congelado durante um concerto na Casa Branca. Ao mesmo tempo, em seu discurso no aniversário de 80 anos do Dia D, na Normandia, em 6 de junho, sua fala lembrando a vitória dos aliados sobre o nazismo foi considerada eloquente e tocante. Havia esperança de que, frente a frente com Trump — que também tem tido sua saúde e condições cognitivas questionadas —, ele poderia ter bom desempenho. Passou longe disso. (Semafor e Forbes)

O formato do debate, em que os moderadores faziam poucas intervenções, permitiu que Trump mentisse ao vivo, sem checagem de fatos na transmissão — o que desagradou analistas e público. A CNN promoveu uma checagem das falas em suas mídias digitais e detectou 30 mentiras de Trump, contra 9 de Biden. (Axios, NYTimes e CNN)

Uma pesquisa rápida feita pela CNN logo após o debate com 565 pessoas que assistiram à transmissão, previamente cadastradas pela emissora, trouxe os seguintes dados: oito em cada dez eleitores (81%) disseram que ele não teve qualquer efeito na sua escolha. Apenas 5% responderam que mudaram de candidato. (CNN)

Kamala Harris, vice-presidente da República: “Algumas pessoas podem discutir sobre estilo, mas esta eleição tem que ser sobre substância, e o contraste é claro. Trump mentiu do início ao fim, como ele queria. Joe Biden é extraordinariamente forte. Sim, teve um começo lento, isso é óbvio para todos. Mas foi um final forte. Não temos que falar sobre 90 minutos de debate, mas sobre os três anos e meio de performance”. (CNN)

Thomas L. Friedman: “Não me lembro de um momento mais doloroso em campanhas presidenciais durante a minha vida — precisamente por causa do que revelou: Joe Biden, um bom homem e um bom presidente, não devia manter a candidatura à reeleição”. (NYTimes).

Imagem: UOL. 

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