Governo Bolsonaro: a fábula do Jabuti na árvore explica a sua prole, que poderá ser a sua torre de Babel

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“Naquela floresta, como em todas as florestas dos contos, reinava o leão. Como rei, não era de ficar zanzando pela floresta. Afinal, uma realeza que se preze, tem de manter uma certa distância dos súditos e da plebe. Raramente, sua alteza, o Leôncio, fazia uma aparição na praça principal, onde havia uma grande árvore – a mais frondosa e imponente de todo o reino.

A vida corria dentro da normalidade. Certo dia, dona arara, repórter local, chegou ao seu escritório, em um galho privilegiado (de onde podia saber tudo a respeito da vida de todos) da árvore central. Começava a preparar a pauta do dia, quando notou algo diferente no galho vizinho: muito bem estabelecido, de mala e cuia, estava ali um jabuti.

Após a edição daquele dia do jornal das oito, a curiosidade e a apreensão com o novo habitante do reino começou a tomar conta de todos. Alguns, curiosos por saber o que ele estava fazendo ali; outros, indignados porque ali não era lugar para um Jaboti passar o tempo inteiro sem fazer nada.

Quem não se acostumou, foi o cão. Com a seu instinto canino, achava que aquele animal fora de lugar, sem função alguma, desequilibrava o ecossistema. Bicho errado no lugar errado, sem nada para fazer, é um perigo. Cedo ou tarde, dá confusão.

Começou, então, a sua cruzada particular: latia insistentemente, pulava balançava a árvore, a fim de desestabilizar o invasor. Em tentativas desesperadas, tentou até alianças com urubus e macacos – sem sucesso. Nada abalava o jabuti.

De repente, apareceu o rei Leôncio. Perguntou ao cão o motivo daquela algazarra. O cão começou a expor seus motivos, mas não chegou a terminar. Foi abrupta e violentamente interrompido pela pata pesada e afiada do rei. Em seguida, a revelação aterradora e uma sentença:

‘Chega! Quem colocou o jabuti na árvore fui eu – e tenho meus motivos. Quanto a você, inconveniente, não há mais lugar para você nessa floresta. Vá embora e não volte nunca mais!’.

Manco de uma perna, o cão saiu com o rabo entre as pernas, sob os olhares apreensivos e curiosos de todos. Nunca mais pôde voltar. Quanto ao jabuti… por que você quer saber? É melhor não incomodá-lo – não faz bem para a saúde.

Daquele dia em diante, todos aprenderam a lição: Jabutis não sobem em árvores. Se ele está lá, não mexa com ele. Alguém com esse poder o colocou lá”.

A fábula citada acima explica muito sobre o atual momento do futuro governo do presidente eleito Jair Bolsonaro. A sensação é que ele pode ter “terminado” antes mesmo de ter começado. Não é exagero deste blogueiro. O modelo brasileiro de exercer o chamado “presidencialismo de coalizão”, torna um presidente eleito quase um imperador em seus primeiros meses, isso, claro, se o seu início ocorrer dentro da normalidade, o que parece que não ocorrerá. Essa instabilidade é tudo que o Congresso Nacional quer do Executivo, ainda mais em início de governo.

Bolsonaro está fazendo o contrário do que propagou na campanha. Está fatiando os ministérios entre os políticos aliados. Alguns de seus escolhidos estão rodeados de denúncias, dentre eles dois superministros: Onyx Lorenzoni e Paulo Guedes (ambos em fase de investigação, o primeiro com inquérito instaurado). A expectativa se frustou? A principal narrativa, a de combate à corrupção se perdeu? O fazer diferente, uma gestão sem o “toma lá, dá cá” que tanto prometeu, virou retórica de disputa eleitoral?

Os fatos falam por si. A montagem da nova gestão escancarou a disputa pelo poder que envolve a prole do presidente eleito, seus superministros, o vice, seus aliados e correligionários (PSL caminhando para um racha interno). Além dos fatores políticos, agora há uma questão grave: denúncias gravíssimas de movimentações bancárias suspeitas, incompatíveis com os rendimentos de quem as operou, além de serem de origem duvidosa.

Tudo começou quando o Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF, apontou uma movimentação considerada atípica, no valor de R$ 1,2 milhão, em uma conta no nome de um ex-assessor do senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho mais velho do presidente eleito Jair Bolsonaro. A informação foi dada pelo jornal O Estado de S. Paulo, na semana passada.

O ex-assessor é Fabrício José Carlos de Queiroz, que, além de ser policial militar, trabalhou como motorista e segurança de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) até 15 de outubro deste ano. Segundo o jornal, o relatório, enviado ao Ministério Público Federal, aponta que as movimentações acima de R$ 1 milhão, realizadas entre janeiro de 2016 e janeiro do ano seguinte, seriam incompatíveis com o patrimônio, a atividade econômica e a ocupação profissional de Queiroz. Segundo a folha de pagamento da Alerj, Queiroz recebia R$ 8.517. Ele ainda acumulava rendimentos mensais de R$ 12,6 mil da Polícia Militar. A reportagem do Estado de São Paulo, destaca ainda movimentações suspeitas, há saques em dinheiro de R$ 320 mil e a emissão de um cheque de R$ 24 mil destinado à futura primeira-dama Michelle Bolsonaro.
Logo que o caso se tornou público na última quinta-feira (06), ocorreu por mais de 24 horas um silêncio estingante por parte dos maiores veículos de comunicação. Só no sábado que o fato foi abordado, pois tomou grandes proporções, sendo o mais noticiado em território nacional. Pior de tudo foram as narrativas feitas por Jair e Flávio sobre o caso. Respostas evasivas e que não esclarecem nada. Há muitas dúvidas sobre o caso: como um assessor movimentou tanto dinheiro assim (1,2 milhão de reais) em um ano? Fez pagamentos à esposa do presidente eleito? Por que o motorista recebeu transferências de outros assessores do mesmo gabinete de Flávio Bolsonaro? E pelo que percebe, foram sacados, e entregues a quem?
Parece que o ano de 2019 será parecido com o de 1992. Exagero? Se forem guardadas as devidas proporções, creio que não. Aguardamos.

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