Não há dúvida que o Roda Viva com o presidenciável Jair Bolsonaro foi sucesso de público. A audiência foi a segunda maior do ano, só perdendo para o programa com o juiz Sérgio Moro. Dados do Ibope apontam que a edição de ontem (30) teve seis vezes mais telespectadores do que a da semana passada com o tucano Geraldo Alckmin. Todos os dados referentes a audiência são restritos a Grande São Paulo, mas sempre servem de parâmetro ao país. A grande repercussão explica – na prática – muito do que acontece nesse período pré-eleitoral, e porque o referido lidera as pesquisas, sem a presença do ex-presidente Lula.
A estada do deputado Jair Bolsonaro no programa Roda Viva gerou grande expectativa, haja vista, que o parlamentar havia definido evitar a sua exposição em programas neste formato. Primeiro pelo perfil polêmico do convidado; segundo pelo frisson que o processo dialético poderia causar, e os rebatimentos disso. O esperado aconteceu: gerou polêmica por diversas afirmativas do presidenciável, e que isso irá repercutir (o que já está acorrendo) nas redes sociais e nos debates políticos nas mais variadas “arenas”.
Recebi diversos contatos em relação ao que achei ou se escreveria sobre o programa. O que penso ou a percepção que tive (mesmo não assistindo ao vivo, pois estava ao telefone resolvendo questões profissionais) não destoa das análises mais isentas e menos apaixonadas. O programa em si foi ruim: do lado da bancada (da pauta no direcionamento das perguntas a quem estava no centro da roda, além da letargia crônica do mediador Ricardo Lessa); e em relação ao nível de respostas dadas por Bolsonaro (algo esperado). Esperava-se do lado os entrevistadores um nível de questionamento mais elevado. Perguntas mais bem elaboradas, sobretudo nas questões centrais do país, do plano e governo e projetos do presidenciável.
De modo geral, na questão de desempenho pessoal, o presidenciável foi bem. Fez o discurso humilde que camufla a sua ignorância sobre diversos temas, não só de economia. Foi ajudado pela opção dos entrevistadores em partirem para o confronto direto; com questionamentos curtos e incisivos ao convidado. Nesta arena, Bolsonaro domina. Responde sempre com frases de efeito; em seu jogo de palavras usa exemplos do cotidiano, rasos e no final, quando não provoca – finaliza polemizando, o que muda o foco e faz seus simpatizantes e defensores vibrarem. Essa é a sua virtude no quesito comunicação ao eleitor que está cansado do “status quo”. Mas tomou outro formato: do confronto direto.
Sobre o conteúdo do programa em si, Bolsonaro não respondeu a diversas perguntas sobre o que pensa e ao seu posicionamento em diversos assuntos. Mostrou um despreparo impressionante, por exemplo, quando desconhece o próprio ofício em Brasília. Sobre a sua produtividade nesses 28 anos de parlamento, foi corrigido em relação aos números de projetos apresentados. “De mais de 500 e poucos” para o número real que é 176; retificado pelo jornalista Bernardo Franco, do jornal O Globo. O seu desconhecimento sobre a História também impressiona. Deturpou sem constrangimentos dados históricos sobre a escravidão, ditadura militar no Brasil e biografias mundiais, como a de Nelson Mandela. Mostrou pessoalmente que é, entre todos os adversários que estão até o momento na disputa o menos preparado.
No plano econômico, ao ser questionado sobre a economia brasileira em um possível governo, deixou claro que pouco irá interferir. O economista neoliberal Paulo Guedes terá total comando e decisões sobre a área. Além de não ter um “plano B” caso a parceria seja desfeita.
Nos próximos dias, o referido presidenciável escolherá o seu vice (depois de quatro recursas dos convidados). Iniciará no mundo real, com os seus – até o momento – oito segundos de TV. As pesquisas já identificaram a sua estagnação. Mantém a liderança (sem o Lula), porém sem margem de crescimento. A sua saída é partir para uma campanha paralela, no campo da internet para manter o seu nível de abrangência (mesmo inferior, abaixo dos seus principais concorrentes). Se isso lhe manterá na liderança ainda não se sabe, mas dificilmente irá lhe colocar no patamar acima das intenções de voto que já possui, identificado nas pesquisas.
O voto em Bolsonaro é em sua maioria cristalizado (segundo pesquisas chega a 80%, o maior entre todos os seus adversários). Portanto, em termos práticos, o programa terá pouco efeito no que diz respeito a intenção de voto no deputado. O que ele pode perder é no campo dos indecisos e aos que relutam em apoiar uma candidatura. Bolsonaro mostrou ontem no Roda Viva – dentro de todas as suas limitações e deturpações – que dará trabalho aos adversários na campanha (especialmente a Alckmin). Que o confronto direto, com perguntas curtas sobre temas polêmicos o favorecem. Se faz necessário – em confronto direto – a exemplo de debates que estão por vim, um outro formato de perguntas e questionamentos. O Roda Viva de ontem foi didático em relação a isso: como favorecer ou não, o presidenciável do minúsculo PSL.