Há quase um mês, quando o ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta foi demitido pelo presidente Jair Bolsonaro, por não seguir as orientações do chefe, Nelson Teich foi o escolhido para substituí-lo. Ao assumir o cargo, escrevi: “Ministério da Saúde não terá protagonismo. Do jeito que o chefe quer” artigo que tratou dos motivos que culminaram na saída de um e a chegada do outro. O próprio título é autoexplicativo. Mandetta além de não seguir as orientações de Bolsonaro (isolamento vertical – algo que nem existe no âmbito científico, o uso de medicamentos sem a devida comprovação da eficácia dos mesmos e por ter reunido, no caso do ministro, protagonismo político), tornou a relação entre ambos, insustentável.
Teich foi escolhido para “não ser”. Não têm pretensões políticas (ao contrário de Mandetta), é de postura reservada, tem perfil técnico, ou seja, não colocaria o ministério em evidência, além de ter sido convidado ao cargo para seguir as orientações do chefe. Isto é, aceitar total subordinação. Todo e qualquer profissional de Saúde que siga bases científicas e recomendações de organizações mundiais, sabe que, as narrativas do presidente Bolsonaro não são aceitas porque não há base científica alguma. Só achismos. O agora ex-ministro não tinha autonomia, não poderia aplicar na prática o que acreditava, e muito menos reforçar o que pregam os especialistas, o que o mundo está segue. Como gerenciar a pasta dessa forma? Fazer e defender algo que não acredita?
O pedido de demissão era a única alternativa. O presidente a forçou. Manteve a sua posição negacionista, continua a defender o uso da Cloroquina, medicamento este que em diversos testes, apontaram que não ocasiona efeito positivo algum sobre o vírus, pelo contrário, há efeitos colaterais perigosos, sobretudo aos cardiopatas. Teich não defendeu o uso do citado medicamento publicamente e, da mesma forma, foi cobrado pelo presidente.
A relação ficou insustentável. Nelson sabia que estaria sob controle, que ao ter um secretário-executivo (o número dois na hierarquia do ministério) militar, não escolhido por ele, e sim pelo Palácio do Planalto, sua submissão estava posta.
O Brasil é o único país do mundo que em meio a uma pandemia, troca duas vezes em intervalo inferior a um mês, de ministro da Saúde. As mudanças não ocorreram por incompetência, e sim porque quem ocupou tal cargo, resolveu seguir os parâmetros e recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), além de orientar os trabalhos através de bases científicas. Não seguir, por exemplo, teorias negacionistas e não submeter o ministério a devaneios mentais do presidente.
Há mais de um ano que escrevo sobre o modus operandi do Bolsonarismo. Da sua forma e necessidade de gerar crises. A capacidade do presidente em fomentar conflitos. Mesmo que isso custe milhares de vidas. Enquanto escrevo este artigo o Brasil passou da faixa dos 14 mil óbitos por Covid-19. Somos o sexto em mortos no mundo. Isso com um nível de subnotificações estrondoso. Mas isso ao presidente não parece ter a devida importância.
Quem irá querer assumir um Ministério da Saúde sabendo que não poderá trabalhar, exercer a função com base na técnica, na Ciência? Só quem é negacionista, quem assim como o presidente, despreza o conhecimento e vive de achismo. Infelizmente estamos à deriva. E isso custará muito mais vidas. O vírus agradece.