Belém, 408 anos. Uma senhora decadente

Quando resolvi escrever sobre o aniversário de Belém, que completa hoje (12) 408 anos de história, a primeira indagação surgiu: abordar fatos históricos? A memória da cidade?  presente? Projeções futuras? Postar um poema? Uma música? Ou retratar em um texto crítico a realidade que cidade vive? Venceu a última alternativa. Explico: a crítica se faz necessária para que se possa, sem muita pretensão deste que vos escreve, sobre o que queremos para a capital do Pará. Por que, por exemplo, se parou no tempo?

O título deste texto foi tomado de empréstimo do saudoso arquiteto e urbanista Flávio Nassar, na ocasião da entrevista que o referido concedeu em um jornal de grande circulação na cidade, há alguns anos. Analisando o processo histórico da ex-metrópole da Amazônia, título que ostentou por décadas e perdeu para a cidade de Manaus, no Amazonas. Percebe-se que o termo utilizado no título é – infelizmente – apropriado e real, sem fantasias ou crises existenciais.

Fundada pelos portugueses em 1616, servindo de “porta de entrada” para a exploração da Coroa na região amazônica. Sem ter a pretensão de fazer abordagem histórica (isso eu deixo para os historiadores), vale, porém, relembrar que a cidade de Belém três séculos depois de sua fundação era a cidade mais importante do Brasil e a de melhor infraestrutura urbana do país. Há cem anos, a capital do Pará tinha mais importância que São Paulo e Rio de Janeiro, esta última a capital brasileira na época. E o que fez Belém ficar tão para trás?

Explicar essa estagnação em relação as cidade do eixo centro-sul citada acima não é tarefa difícil, porém trabalhosa. Requer muitas abordagens históricas. Irei me eximir de tal responsabilidade e livrá-los de ler essa maçaroca de informações. A proposta deste texto é outra. Visa analisar o presente e projetar o futuro da capital do Pará. Belém é o 16º município mais antigo do Brasil, o segundo da Amazônia, ficando atrás apenas de Vigia de Nazaré, no nordeste paraense.

A pergunta que fica no ar é: há o que comemorar nos 408 anos de Belém? Sem saudosismo, digo que não. Qual obra de grande porte ou que possa mudar a realidade da cidade está sendo entregue na data corrente? Nenhuma. Há vários aniversários a capital do Pará comemora de forma formal, com bolo gigantesco em seu maior cartão postal (Ver-o-Peso) e solenidade de nossas autoridades. E só. Nada, além disso. Obras, algumas pontuais, quase sempre reformas. Belém vai – infelizmente – se tornando uma cidade decadente. Esse processo vem acontecendo há, pelo menos, quatro décadas. Perdeu gradativamente a importância do passado. Deixou de ser a capital da região amazônica, a cidade mais importante do Norte do Brasil, a porta de entrada para a região (com vantagem por sua posição geográfica). Manaus assumiu – sem grito – a dianteira e vai se distanciando à frente a cada ano.

A capital do Pará vem (isso pode explicar tal decadência em parte) sofrendo, e ainda sofre, de péssimas gestões que passaram e estão no Palácio Antônio Lemos. A cidade parou no tempo. Nada de moderno no que diz respeito à organização urbana, sobretudo, à mobilidade urbana foi feito ou realizado. Em comparação com 20 anos, a diferença é a criação de novas vias e só. Ou paliativos como mudanças de fluxo de vias. Belém caminha para o colapso em sua mobilidade urbana. O maior projeto na área, BRT, não foi concluído e se tornou um mero corredor expresso para ônibus convencionais.

Belém é uma cidade típica de um padrão econômico de centros urbanos brasileiros. Sobrevive do setor terciário. Sua economia é mantida pelo comércio e serviço com alto grau de informalidade (índice de 40%, dados desatualizados de 2008, segundo o IBGE), o que cria um grande rombo na arrecadação municipal. Costumo afirmar que administrar Belém é mais difícil do que o próprio estado do Pará. A Prefeitura não tem manobra orçamentária, o custeio da máquina e outros compromissos consomem mais de 60% do erário. Sobra pouco para investimentos. Não, por acaso, as grandes obras na cidade são sempre em parceria com os governos estadual e federal (com menor contrapartida da prefeitura). Portanto, a gestão de Belém não é para principiantes, amadores ou gestores que só possuem boa vontade, ou, em alguns casos, nem isso.

Outra questão que explica a decadência da capital paraense é o deslocamento da economia cada vez mais para os centros urbanos localizados no interior. O fluxo de capitais e investimentos continua a chegar a Belém, mas em volume cada vez menor, dividido entre a capital e outras praças, especialmente no Sudeste do Pará, região que vai sustentando a balança comercial paraense, mesmo recebendo baixo nível de recursos do poder público estadual, perante essa importância econômica. O fluxo populacional se inverte. Muitos deixam a capital do Pará e vão buscar melhores oportunidades em outras cidades.

Já escrevi diversas vezes sobre a economia paraense, externando preocupação sobre o futuro, sobretudo, econômico da capital do Pará, frente ao novo perfil das cidades do interior do estado. O processo de perda da importância economia e política de Belém parece ser irreversível. Como bem resumiu Nassar: “Uma senhora decadente”, com quatro séculos de existência. De qualquer forma, parabéns Belém, uma cidade linda, porém tão mal cuidada por seus gestores e classe política de forma geral.

Ano eleitoral 

Belém completa 408 anos sob a expetativa de mais uma disputa eleitoral. O atual prefeito, Edmilson Rodrigues (Psol) em sua terceira passagem pelo Palácio Antônio Lemos, vive um delicado momento. Sua popularidade é baixa, inversamente proporcional à sua rejeição, inviabilizando o seu projeto de reeleição. Em meio de uma gestão ruim, quem sofre é a população e a cidade que parou no tempo. Pobre Belém.

Imagem: Belém.com

#veja mais

O Novo Ostentação

Tem um ditado antigo, muito sábio, que diz que “de boas intenções, o inferno está cheio” … E eu já começo mal, supondo que o

MMA diz que 66% dos municípios não estão preparados para mudanças climáticas

A secretária de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente, Ana Toni, disse que 3.679 municípios brasileiros, ou seja, 66% de um total de

Após dois meses de deflação, IPCA-15 sobe em outubro

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo-15 (IPCA-15), considerado a prévia da inflação oficial, subiu 0,16% em outubro, sobre queda de 0,37% no mês

Mais uma vez a lama levou tudo. A lição de Mariana não serviu de nada

Passava das 16 horas quando um barulho ensurdecedor interrompeu, em 5 de novembro, a tranquila rotina do distrito de Bento Rodrigues, na cidade mineira de

Senado: gastos da bancada paraense em novembro

Em mais um levantamento exclusivo feito pelo Blog do Branco em relação às finanças públicas, tendo como base os números disponibilizados pelo Senado Federal, descobriu-se

Edmilson e quem?

A disputa eleitoral na capital paraense segue com algumas definições e incertezas. Certo é que o ex-prefeito Edmilson Rodrigues (Psol) segue na liderança isolada. As