O chaveiro

Era junho de 2006, eu com vinte e poucos anos, trabalhando em uma empresa de navegação, em Belém, com uma realidade de baixo contato com o mundo cibernético, até porque os meios de acesso eram mais restritos e caros. Para um jovem de poucos recursos como eu, no qual o salário mal chegava ao fim do mês, mesmo gastando só com prioridades, ter um computador em casa era algo fora da realidade.

Aproveitava que o meu trabalho não era mais nas ruas e sim em um ambiente fechado, refrigerado, com equipamentos eletrônicos, que me permitiam acesso à Internet. Foi assim, na busca por notícias, que comecei a conhecer e desvendar o mundo dos portais, das colunas, dos artigos de opinião, que desaguei no espaço que Gilberto Dimenstein tinha na Folha de São Paulo. Sempre entre as colunas mais lidas. Gostei logo de cara. Os artigos sobre política e cotidiano, eram leves, de fácil compreensão. E isso era importante para mim, pois sem hábito de leitura até aquele momento, com pouca rodagem no mundo literário, ler algo que se entenda no ato da leitura, é importante para que se continue, crie hábito, gosto. Costumo dizer que Dimenstein foi o culpado por eu ter descoberto esse mundo analítico da política, cristalizado à época nos jornais.

Depois dele, vieram Carlos Heitor Cony e Clóvis Rossi. Esses dois últimos nos deixaram, infelizmente, recentemente. Para ambos prestei as devidas homenagens. Ao Cony uma crônica intitulada: “Cony, a minha droga” (Leia aqui) e outra produção saudando Rossi: “Rossi, a minha outra droga” (Leia aqui). Os li muito. Gilberto abriu a porta e Clóvis e Carlos Heitor me fizeram gostar ainda mais e ficar.

Um fato peculiar era que em vez de ler na tela do computador, eu imprimia todos os artigos dos citados, e de outros que ia conhecendo. Fazia isso porque estava no trabalho, não poderia ler e muito menos ser pego lendo em horário de expediente. Tal ação era feita no deslocamento de volta para casa, em um coletivo, geralmente lotado. Muitas impressões eram a esmo, nem o título delas eu lia, mas sabia de antemão que iria gostar pela costumeira qualidade de seus produtores. Confesso que promovi um verdadeiro crime ambiental de tanto papel que gastei com essas ações, mas era a única forma que tinha de aprender e ter o conteúdo em casa.

Dimenstein se foi. Perdeu a luta quase sempre invencível para o câncer, no seu caso, originalmente no pâncreas e depois figado. Escreveu uma notável crônica sobre a doença, que foi publicada na Folha de São Paulo. Após tal postagem, foi convidado a escrever um livro para descrever a própria luta. Mas piorou rapidamente e nos deixou no último dia 29.

Conforme escrevi, Gilberto Dimenstein foi o culpado, pois foi o porteiro. Carlos Heitor Cony e Clóvis Rossi foram drogas que fizeram – após entrar – eu ficar e ter pego o gosto em ler e escrever, ações que faço com o maior prazer. Valeu, Gilberto pela oportunidade, por ter sido a chave que abriu a porta. A mim foi um chaveiro. Descanse em paz.

Henrique Branco

Formado em Geografia, professor das redes de ensino particular e pública de Parauapebas, pós-graduado em Geografia da Amazônia e Assessoria de Comunicação. Autor de artigos e colunas em diversos jornais e sites.

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